BPM e Cultura Organizacional

Vários estudos descrevem como a cultura organizacional pode ter um impacto substancial na adoção de BPM. A cultura também está diretamente ligada ao sucesso ou fracasso das iniciativas de BPM1. Além disso, uma boa governança para o processo de implantação é necessária, o que contribui também para o sucesso do negócio. O termo governança do processo empresarial refere-se à direção, coordenação e controle de indivíduos, grupos ou organizações que são pelo menos até certo ponto autônomos, o que significa que a autoridade hierárquica sozinha não é suficiente para garantir um desempenho efetivo2.

Antes de iniciarmos um processo como este, devemos fazer alguns ajustes entre a cultura vigente e o BPM. A abordagem de BPM precisa se encaixar na cultura da organização, para que posteriormente esta mesma cultura possa ser uma impulsionadora da iniciativa. Ser contrário a cultura, ou tentar mudá-la de forma radical, pode traumatizar toda a organização.

A cultura refere-se às suposições, valores ou crenças básicas de um grupo3. E não existem muitas pesquisas que nos informam quais são os tipos de culturas que apóiam e tornam menos desafiador a implantação do BPM. Não temos claro também quais os valores organizacionais necessários para a cultura de BPM. Em algumas organizações, por exemplo, em sua carta de valores temos expressões como: processo eficientes e efetivos, ou otimização de processos, mas a apenas conter estes termos não garante a mudança cultural necessária.

Sendo que estes valores não são a garantia da implantação segura de BPM, vamos tentar responder neste artigo quais são os valores que efetivamente vão proporcionar um ambiente receptivo para o BPM. Somente uma cultura baseada no trabalho em equipe, vontade de mudança, orientação para o cliente, responsabilidade pessoal e um estilo de liderança cooperativa ajudam a abordar o tema.

Podemos descrever BPM como uma forma holística de se pensar a organização que visa em primeiro lugar romper as barreiras funcionais. O objetivo é o sucesso do processo ou serviço não sendo apenas de uma área específica. Pesquisas recentes mostram que um driver importante para alavancar esta transformação é o setor de tecnologia, entretanto a cultura de BPM vai muito além disso, sendo discutida em níveis estratégicos, alinhada ao negócio da organização. Essa mudança fica mais evidente no modelo de maturidade proposto por Rosemann and de Bruin (2005) que inclui vários fatores principais além da TI, ou seja, alinhamento estratégico, governança, métodos, pessoas e cultura4. Outros modelos também expandem o tema.

Valores

Somente uma cultura baseada no trabalho em equipe, vontade de mudança, orientação para o cliente, responsabilidade pessoal e um estilo de liderança cooperativa5 podem ser úteis para estimular o início da transformação. Além destes valores, a pesquisa feita por Theresa Schmiedel, Jan vom Brocke  e Jan Recker em 20136 apontam uma série de outros valores que vamos detalhar no decorrer do artigo. A identificação e definição desses valores representa um primeiro passo para a operacionalização e apoio para a cultura favorável à consecução dos objetivos de BPM.

Não é tema deste artigo abordar detalhes da pesquisa. Nosso objetivo está no resultado. Podemos dizer que a pesquisa foi feita a nível mundial, utilizando a técnica delphi. Como resultado, a pesquisa apresentou, dentre outros valores, o acrônimo CERT que representam os seguintes valores:

Orientado ao Cliente (Customer orientation (C))

Refere-se à atitude pró-ativa e responsiva em relação às necessidades dos clientes em relação a saída do processo.

Excelência (Excellence (E))

Refere-se à orientação para melhoria contínua e inovação para alcançar um desempenho superior dos processos.

Responsabilidade (Responsibility (R))

Refere-se ao compromisso com os objetivos do processo e a responsabilização pelas decisões.

Trabalho em equipe (Teamwork (T))

Refere-se à atitude positiva em relação à colaboração interfuncional.

Se fizermos um comparativo com a literatura existente, vamos observar que a pesquisa é aderente ao já exposto. Pelo lado prático os valores apresentados são extremamente relevantes para a adoção da cultura BPM. É fundamental que estes valores saiam do papel e possam estar presentes no cotidiano dos funcionários.

Encontrar estes valores em uma só cultura é muito difícil e pode ser que um dos fatores críticos de insucesso nas implantações de BPM passe por aí. Se nós fizermos um paralelo com o CVF (Competing Values Framework) apresentado por Cameron and Quinn (2006)7, um dos modelos mais influentes e amplamente utilizados na área de pesquisa de cultura organizacional, vamos identificar cada valor em uma perspectiva diferente conforme figura abaixo:

Figura extraída do livro: Diagnosing and Changing Organizational Culture: Based on the Competing Values Framework com os valores inseridos.

O ideal é que possamos desenvolver os valores que estão faltando na cultura vigente.

Espírito Santo

O Escritório Central de Processos – ECP do Governo do Estado do Espírito Santo busca atuar  na disseminação da cultura do Gerenciamento de Processos e no incentivo para que sejam adotadas boas práticas de gestão sempre visando entregar melhores serviços à sociedade capixaba.

Um dos objetivos do Escritório Central é a criação de uma rede de Escritórios Locais nas diversas Secretarias e Autarquias do Estado. Os Escritórios Locais têm a missão de administrar, dar suporte e fomentar iniciativas de Gerenciamento de Processos (BPM – Bussiness Process Management) no âmbito do seu órgão, sob a supervisão e mentoria do Escritório Central.

Um dos diferenciais do ECP é estar localizado junto a área de inovação do Governo, o que impulsiona ainda mais o trabalho do Escritório. No mundo dos negócios, a criatividade se manifesta na forma de inovação8. E com este objetivo os servidores que compõem o ECP frequentemente participam dos cursos na área de inovação. Foi incorporado ao Escritório o BPI (Business Process Innovation) – Inovação em Processos de Negócios que utiliza técnicas e ferramentas de design para a melhoria contínua de processos.

O BPI procura sempre colocar o cliente ou os próprios servidores no centro dos processos e a partir dele e das dores por que eles passam, buscar soluções colaborativas com protótipos e testes, antes da solução definitiva.

Nos processos de Governo, a modelagem dos fluxos, a melhoria contínua e otimização dos processos acontecem em rede, pois os impactos das mudanças vão além das caixas que compõem o organograma.

A inovação do modelo de negócios é uma questão transversal que mostra um alto grau de interconexão com conceitos como recursos, vantagem competitiva, estratégia, capacidades dinâmicas, dependência de caminho e modelo de negócios9.

Referências Pesquisadas:

1. Brocke, J. v. and M. Rosemann (2010). Handbook on Business Process Management 1: Introduction, Methods and Information Systems. Berlin.
2. M. Lynne Markus and Dax D. Jacobson em Brocke, J. v. and M. Rosemann (2010). Handbook on Business Process Management 1: Introduction, Methods and Information Systems. Berlin.
3. Schein, E. (2004). Organizational Culture and Leadership. San Francisco, CA, Jossey-Bass.
4. Rosemann, M. and de Bruin, T. (2005), “Towards a business process management maturity model”, artigo apresentado na 13th European Conference on Information Systems (ECIS 2005), Regensburg, Germany.
5. Markus Kohlbacher Stefan Gruenwald, (2011),”Process orientation: conceptualization and measurement”, Business Process Management Journal, Vol. 17 Iss 2 pp. 267 – 283
6. Theresa Schmiedel Jan vom Brocke Jan Recker, (2013),”Which cultural values matter to business process management?”, Business Process Management Journal, Vol. 19 Iss 2 pp. 292 – 317
7. Cameron, K.S. and Quinn, R.E. (2006), Diagnosing and Changing Organizational Culture: Based on the Competing Values Framework, Jossey-Bass, San Francisco, CA.
8. Kelley, Tom, Confiança criativa: libere sua criatividade e implemente suas ideias / Tom Kelley, David Kelley: São Paulo: HSM do Brasil, 2014
9. Beattie, V. & Smith, S.J., 2013. Value creation and business models: refocusing the intellectual capital debate. The British Accounting Review, 45(4), pp.243–254.